A pobreza, o empobrecimento situam-se, em meu entender, entre os principais problemas sociais. A repressão e a violência andam-lhe mui perto. Compreendo e aceito no grupo de problemas o demográfico, em casos como o galego, porque implica desatenção, falta de cuidado, soledade e mais pobreza; despovoamento também, mas depende como e para quem; não outras perspetivas. Eu penso que o nosso principal problema social é o individualismo, inclusive raiz de que aquele empobrecimento e aquela repressão continuem. Bom, é o triunfo do neo-liberalismo, certamente. A ideia, vital, de que devemos preocupar-nos por nós e polo nosso entorno imediato, constituído, de regra, por familiares diret@s, por quem nós decidimos que deve estar constituído; e polos assuntos que nós decidimos que deve estar constituído. Detenho-me apenas um momento nesta última frase: lógica e irrelevante, provavelmente a muitos olhos: definição dumha soberania pessoal sobre a qual nada deve prevalecer: nengum problema ou preocupação que eu não defina como próprio, nengumha circunstância sobre a qual não sinta impelid@ a atuar podem impor-se a essa soberania. E se as sentir e não atuo, não sou responsável, porque outras pessoas e instâncias o são ou o são mais; ou porque tenho outros assuntos a que atender (assuntos normalmente cujo limite é a pessoa mesma, não transcende @ própri@ indivídu@: fazer desporto, ler, assistir a umha concentração.
O individualismo atual também não dá explicações. Pode comprometer-se a algumha cousa e não cumprir, sem que isso seja objeto de justificação perante o que/quem se comprometeu; pode não responder; pode: é o seu direito soberano individual. Pode não comprometer-se; pode nem sentir-se interpelado. Pode atuar sem memória, sem agradecimento. Bastante tem com salvar a si mesmo…!
E sentido comunitário
E, no entanto, há remédio, remédios humildes e caseiros, remédios locais, remédios de proximidade, remédios redes de proximidades, redes de remédios de proximidades; olhares e vontades que se levantam um pouquinho; que transitam; que aprendem em muitos passados e alguns presentes e em olhos e desejos que não é irremediável, que encontram satisfação ao imaginar que podem fazer cousas concretas que as transcendam, que podem inserir no seu quotidiano essas cousas; que podem ver que essas cousas que fazem fazem que outros seres estejam melhor; e, até, que se unam à corrente interminável de quem acredita e concretiza.
Que pensam em termos de comunidade e imprimem sentido comunitário à sua forma de entender e fazer. Que se associam a outras, que geram coletivos para avançar no concreto e no possível, com medo atenuado ao impossível. E que, quando pensam que já não podem ir além, que estão gastas e inservíveis, pressionadas, estressadas, levantam-se sobre si mesmas para recuperar a ideia humilde de que fazem parte daquele coletivo ou desta comunidade, descansam um pouco ao pé da árvore ou da casa, prosseguem o caminho empreendido, alimentam-se do olhar e do desejo, do feito e do por fazer, espelhado no que conseguirom, traçado no que ainda virão a conseguir. Humildes por despretensiosas mas soberbas na eficácia, transitando, sem estridência, comprometidas e, ainda, mais que comprometidas, essência natural das comunidades e coletivos a que pertencem, naturalizado o que era esforço reflexivo, sendo que a sua vida é no ser social que se encontra. Colocando a sua soberania pessoal, intransferível, na sequência do seu ser coletivo, transitivo, associado, comunitário. De que abraçar alguém significa usar e estender os próprios braços para vincular-se; um ato supremo de soberania pessoal.