(deixemos agora o terrível eufemismo, a crua mentira que distingue entre ocupad@s e desocupad@s segundo as pessoas tenham um emprego, qualquer, e recebam dinheiro, qualquer, por ele).
Umha das grandes conquistas do capitalismo atual, avançado, de mãos dadas com o neo-liberalismo, é a perda de sentido coletivo da vida: o enfraquecimento da solidariedade e da ajuda através do Estado, minguadas as redes sociais de apoio mútuo, são frequentemente substituídas polo feroz individualismo: que cada quem solucione a sua vida, que cada quem já tem bastante com a sua. Chega com ver determinado urbanismo (e ruralismo) moderno e o seu homólogo económico de grandes superfícies e atividades extra várias para entender o individualismo gregarista em que vivemos.
E penso, demagogicamente é claro, então, nas mulheres que levam a sua família para a frente, ajudam vizinh@s, cuidam outras pessoas, passeiam, e trabalham, trabalham, trabalham; e o tempinho que lhes resta é para um mimo ou para um casaquinho para a neta; na moça que trabalha todas as tardes na Cruz Vermelha com emigrantes, estuda, ano a ano, e toma café com a amiga triste. Nada querem em troca desse tempo investido; recebem o alento do inexorável, de que outra cousa não poderiam fazer. E vejo tanta gente sem tempo para nada…!, que tenho pena soberba de tantas pessoas sem tempo para nada, tão ocupadas; ou das que cobram o pouquinho que fazem, que bastante é tudo o que fazem.
Estamos tão ocupad@s, que iremos a terapia o dia que reparemos que não era verdade; que não estávamos tão ocupad@s; que nos desorganizarom, que nos estamos desorganizando, tão ocupad@s na nossa individualidade, que não teremos amig@s que nos escuitem; nem com quem fazer coletivamente: ocupad@s. Que vivemos na grande mentira correlato daquele individualismo feroz: ainda que não o assumanos, ainda que não reparemos nisso; ainda que o neguemos: que cada quem se amanhe. Que a satisfação não seja fazer cousas com outras para que alguém que não sejamos nós (e, de passagem, nós!) esteja melhor ou ajude outr@s a estar melhor; que associar-se para isso era perder o tempo que não tínhamos, tão ocupad@s que estávamos em usar o tempo que não tínhamos. Em vez disso, e saltando por cima destes parvos trocadilhos que aquí escrevo, recuperar a satisfação de fazer cousas para as quais não há tempo que perder em lugar de andar perdendo o tempo, exceto quando for conveniente perdê-lo para voltar ganhá-lo.